- O RESSEGURO
1.1.EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO RESSEGURO
Como é natural,
o resseguro teve a sua origem no próprio seguro directo, embora não haja
indicadores muito precisos quanto ao seu começo. Sendo o seguro de Transportes
o mais antigo de todos os seguros, o primeiro documento mencionando uma
operação de resseguro refere-se precisamente a um negócio marítimo e tem a data
de 1370.
Sabe-se que nos
primeiros tempos as seguradoras apenas aceitavam os riscos que podiam conservar
inteiramente para si, dentro, portanto, dos limites de uma gestão financeira
prudente. Deste modo, as seguradoras procuravam evitar que nas suas carteiras
existissem riscos de uma mesma classe, a fim de não colocarem em perigo as suas
solvabilidades. E quando os riscos ultrapassavam os seus plenos de conservação,
procuravam então ressegurar os excedentes em seguradoras do mesmo mercado, numa
base facultativa e de reciprocidade.
Com o
desenvolvimento industrial no século XIX, o seguro evoluiu e a consequência
natural desta evolução foi o aparecimento de riscos cada vez mais importantes
em termos financeiros e a necessidade de obtenção de coberturas mais flexiveis.
Recorde-se aqui
a origem da Lloyd’s que tomou o seu
nome a partir do café do Sr. Edward Lloyd,
onde, por volta de 1680, se reuniam muitos comerciantes com interesses ligados
a navios e mercadorias. Não era Edward
Lloyd quem aceitava seguros, mas sim os seus clientes, mais tarde
conhecidos por underwriters, por sua
própria conta e risco. Destes começos cresceu uma grande sociedade de fama mundial
como mercado internacional de seguros e centro mundial de informações
marítimas. De referir que naquela época, apesar de toda a sua capacidade de
subscrição, já nem a própria Lloyd’s
conseguia dar resposta às exigências do mercado.
Em consequência
destas limitações, era imperativo o alargamento do resseguro e, assim,
criaram-se as resseguradoras profissionais, das quais são de destacar a Cologne Ré (1853), a Frankfurter (1856), a Magdburger (1862), a Suisse Ré (1863), a Munich Ré (1880), a Société
Annonyme de Réassurances (1884) e a Mercantil
& General (1907).
As
resseguradoras, desde os seus primórdios, compreenderam que só uma repartição
dos seus negócios numa base muito ampla poderia garantir o equilíbrio das suas
carteiras. Por esta razão, procuraram estender as suas relações a todas as
partes do mundo e daí que o mercado ressegurador seja caracterizado sobretudo
pela sua internacionalização, flexibilidade e inovação. Embora estas
características também se apliquem ao mercado segurador, elas estão nitidamente
mais presentes no mercado ressegurador. Hoje em dia, é vulgar um ressegurador
trabalhar com várias dezenas de unidades monetárias, dada a dispersão
geográfica dos seus negócios, o que pode tornar-se complicado se tivermos em
conta os efeitos das flutuações cambiais e os problemas políticos vividos em
muitos países.
1.2.CONCEITO DE RESSEGURO
Como facilmente
se compreende, nenhuma seguradora, por muito poderosa que seja, poderá assumir,
sob sua exclusiva responsabilidade, certos riscos de quantias avultadas. Um
moderno arranha-céus, uma grande fábrica, o casco de um avião, um complexo
industrial, um grande petroleiro, uma central nuclear, uma refinaria, uma nave
espacial, etc. não podem ou não devem depender única e exclusivamente das
disponibilidades financeiras de uma só seguradora já que, se essa seguradora
assumisse sozinha tais riscos, estaria certamente condenada à falência. Por
muito avultados que fossem os montantes recebidos por esses seguros, a título
de prémios, e mesmo que durante anos seguidos se não registassem sinistros,
logo que ocorresse um de certo montante, nem os prémios nem as provisões
constituídas seriam certamente suficientes para pagar o sinistro.
O seguro e o
resseguro são, por natureza, duas actividades interdependentes. Tal como um
cidadão comum transfere habitualmente para as seguradoras os seus riscos, estas
repartem parte desses riscos com os resseguradores, caso sintam que não
conseguem fazer face às responsabilidades assumidas perante os tomadores de
seguro. É a chamada repartição vertical dos riscos em oposição à repartição
horizontal dos riscos, que se verifica no co-seguro.
Da mesma forma
que o tomador do seguro paga um prémio de seguro ao tentar proteger-se de um
risco segurável, também as seguradoras transferem parte desse risco para os
resseguradores, a quem pagam um prémio de resseguro. É a este seguro do seguro
que na terminologia técnica se chama resseguro. Por este sistema, o risco
poderá ficar extremamente fraccionado ou diluído através de uma série de
resseguros sucessivos. Daí o resseguro ser considerado a arte de pulverizar o
risco do seguro.
No resseguro
apenas o segurador directo responde perante o tomador do seguro apesar de o
risco estar repartido por várias seguradoras. A sua existência não interfere
nas ligações entre o segurador e os seus tomadores do seguro, não tendo estes
qualquer intervenção no processo, podendo, inclusivamente, desconhecer a
existencia do resseguro.
O resseguro é,
assim, a pedra basilar de toda a actividade seguradora e a ele se deve, na sua
quase totalidade, o sucesso da divisão do risco. Com a prática do resseguro, o
risco ultrapassa fronteiras, atravessa oceanos, fazendo diluir, por vezes por
vários continentes, os efeitos nefastos de um sinistro. Aliás, o carácter
internacional do seguro tornou-se praticamente uma constante através do
desenvolvimento do resseguro, hoje imprescindível na actividade seguradora.
O resseguro é
normalmente aceite por resseguradoras especializadas mas também podem
efectuá-lo sociedades que pratiquem fundamentalmente o seguro directo. Assim
sendo, o resseguro poder ser levada a efeito entre:
- Duas ou mais
seguradoras;
- Uma seguradora
e uma ou mais resseguradoras;
- Duas ou mais
resseguradoras.
De referir que o
processo descrito não termina nos resseguradores. Muitas vezes estes operadores
necessitam de ceder os seus riscos a outros resseguradores, criando assim uma
cadeia cujo principal objectivo é a distribuição ou repartição do risco.
Estamos, assim, perante o resseguro do resseguro, denominado de retrocessão, que é, portanto, o
resseguro de um negócio já tomado em resseguro. Os novos resseguradores,
chamados retrocessionários, seguem igualmente a metodologia da repartição do
risco, originalmente proposto pelos tomadores do seguro, que se mantêm alheios
ao processo desde o seu início.
1.3.CONTABILIZAÇÃO DO RESSEGURO
1.3.1.
O
RESSEGURO CEDIDO. CONTAS A MOVIMENTAR E
LANÇAMENTOS A EFECTUAR
No resseguro
cedido, a ressegurada, na contabilidade da qual nos encontramos, é a entidade
que cede o negócio havendo a registar, na sua escrita, os seguintes factos:
a)
Prémios;
b)
Comissões (caso
existam);
c)
Sinistros.
a)
Prémios
Em resseguro, quando
nos referimos a prémios estamos a pensar em prémios simples, por não existirem
quaisquer encargos. Também o prémio de resseguro, quando calculado em
percentagem do prémio do seguro directo, representa esta percentagem do prémio
simples (do seguro directo).
Nos tratados de
resseguro proporcionais (de quota-parte e de excedentes de capitais) a cedência
do prémio simples, como oportunamente foi referido, acompanha a percentagem (é
a mesma) de cedência do risco.
Os prémios de
resseguro cedido são registados a débito da conta “- Prémios de Resseguro
Cedido” por contrapartida de “- Resseguradores”, subcontas respectivas.
Far-se-á o lançamento inverso pelos prémios anulados.
Aquela conta de
proveitos e ganhos, cujo saldo representa o valor líquido dos prémios cedidos
em resseguro no próprio exercício, inclui, de acordo com o Plano de Contas de
Empresas Seguradoras, todos os prémios pagos ou a pagar, respeitantes a
contratos de resseguro celebrados pela empresa de seguros. As entradas de
carteira a pagar aquando da celebração ou alteração de contratos de resseguro
devem ser debitadas; por sua vez, as saídas de carteira a recuperar devem ser
creditadas.
O resseguro
tanto pode ser proveniente de seguro directo (Vida e Não-Vida) como do
resseguro aceite (Vida e Não-Vida). Daí o Plano de Contabilidade de Empresas
Seguradoras desdobrar a conta “- Prémios de Resseguro Cedido” da seguinte
maneira:
- De Seguro
Directo Vida;
- De Seguro
Directo Não-Vida;
- De Resseguro
Aceite Vida;
- De Resseguro
Aceite Não-Vida.
Por sua vez,
todas estas contas do 2.º grau se desdobram como segue:
- Prémios;
- Entradas de
Carteira;
- Saídas de
Carteira.
Quanto à conta
“- Resseguradores”, que regista o movimento de efectivo com resseguradores
resultante de negócio cedido ou retrocedido, é desdobrada pelo Plano de
Contabilidade de Empresas Seguradoras da seguinte maneira:
- Filiais;
- Associadas;
- Outras Participadas
e Participantes (Incluindo Empreendimentos Conjuntos);
- Outros
Resseguradores.
De notar que o
movimento do resseguro cedido deve ser coincidente com o do seguro directo, ou
do resseguro aceite (no caso da retrocessão). Assim, se no seguro directo se
processam, anulam ou estornam prémios de apólices abrangidas por um contrato de
resseguro, deverá, de imediato, ser contabilizada a parte correspondente ao
resseguro cedido, com comunicacão, nos termos do contrato, ao ressegurador. O
mesmo se diga em relação aos sinistros.
Do ponto de
vista contabilístico, os lançamentos a efectuar são os seguintes:
i)
Pelo
processamento do prémio de resseguro cedido
Ø A
débito
-
Prémio de Resseguro Cedido /.../ Prémios.
Ø A
crédito
-
Resseguradores
ii)
Pela anulação do prémio
de resseguro
Lançamento
inverso ao da alínea anterior.
b)
Comissões
(caso existam)
As comissões,
como oportunamente foi referido, apenas existem, regra geral, nos tratados de
resseguros proporcionais.
Como é
compreensível, os resseguradores tentam influenciar os seus ressegurados de
forma a obterem resultados positivos nos respectivos tratados de resseguro,
dando-lhes uma participação nos lucros. Assim, para além de uma comissão fixa
prevista no tratado, a remuneração devida pelo ressegurador à cedente, a titulo
de comissão, é, no geral, complementada por uma retribuição adicional cuja
concretização dependerá do comportamento do tratado no final de cada exercício
contabilístico. Essa retribuição adicional designa-se por “participação nos
lucros” e constitui, por assim dizer, um “prémio” dado à cedente como
compensação pela “boa qualidade” dos negócios cedidos.
Nesse sentido,
os tratados que estabelecem a existência de participação de lucros têm de
indicar não só a percentagem do lucro que deverá ser creditada à cedente como
também a forma como esse lucro é apurado, o que obriga à elaboração de uma
“conta de participação nos lucros”, na qual constarão os elementos necessários
ao apuramento da participação (proveitos e custos ou rendimentos e gastos).
Essa
participação, acrescente-se, é tida como uma comissão adicional e como tal
contabilizada.
Tanto as
comissões como as participações nos resultados são contabilizadas a crédito da
conta “- Comissões e Participações nos Resultados de Resseguro Cedido” por
contrapartida de “- Resseguradores”, subcontas respectivas. Far-se-á o
lançamento inverso pela anulação de comissões e participações.
O Plano de
Contas das Empresas Seguradoras desdobra aquela conta de Proveitos e Ganhos da
seguinte maneira:
- De Seguro
Directo Vida;
- De Seguro
Directo Não-Vida;
- De Resseguro
Aceite Vida;
- De Resseguro
Aceite Não-Vida.
Do ponto de
vista contabilístico, os lançamentos a efectuar são, pois, os seguintes:
i)
Pelo
processamento da comissão e da participação nos resultados
Ø A
débito
-
Resseguradores.
Ø A
crédito
-
Comissões e Participação nos Resultados de Resseguro Cedido
ii)
Pela
anulação da comissão e da participação nos resultados
Lançamento
inverso ao da alínea anterior.
c)
Sinistros
Como já foi
referido, a contabilização dos sinistros, em resseguro cedido, deve acompanhar par e passo a do seguro directo – ou do
resseguro aceite, se se tratar de uma operação de retrocessão. Portanto, se em
seguro directo se processam sinistros, se reajustam provisões, se pagam
sinistros, etc.e se o contrato interessa ao resseguro, tais operações devem ser
de imediato reflectidas na conta do ressegurador.
Assim, pela
imputação aos resseguradores da parte que lhes cabe no custo total do sinistro
credita-se, consoante o caso, a conta “- Custos com Sinistros / Parte dos
Resseguradores nos Custos com Sinistros Vida” ou a conta “- Custos com
Sinistros / Parte dos Resseguradores nos Custos com Sinistros Não-Vida”,
subcontas respectivas, por contrapartida de, respectivamente, “- Proviões
Técnicas de Resseguro Cedido Vida” e “- Provisões Técnicas de Resseguro Cedido
Não-Vida”, subcontas respectivas.
No âmbito
daquelas contas de Custos e Perdas, devem ser creditadas as saídas da provisão
para sinistros a recuperar aquando da conclusão ou alteração de contratos de
resseguro cedido, enquanto que as entradas da provisão para sinistros, a pagar,
devem ser debitadas. Por sua vez, as contas de provisões, compreendem os
montantes efectivos ou estimados que, em conformidade com os acordos ou
contratos de resseguro, correspondem à parte dos resseguradores nos montantes
brutos das provisões técnicas do seguro de Vida ou do seguro Não-Vida,
consoante o caso.
Como o resseguro
cedido tanto pode ser proveniente de seguro directo como de resseguro aceite, o
Plano de Contabilidade de Empresas Seguradoras desdobra as contas acima
referidas em função dessa proveniência. Daí o ter-se em todas elas subcontas
com designação “De Seguro Directo” e “De Resseguro Aceite”.
Do ponto de
vista contabilístico, os lançamentos a efectuar envolvendo as contas acima
referidas são os seguintes:
i)
Pelo
montante da provisão para sinistros a cargo dos resseguradores
Ø A
débito
-
Provisões Técnicas de Resseguro Cedido Vida /.../ Provisão para Sinistros; ou
-
A Provisões Técnicas de Resseguro Cedido Não-Vida /.../ Provisões para
Sinistros.
Ø A
crédito
-
Custos com Sinistros / Parte dos Resseguradores nos Custos com Sinistros Vida
/.../ Na Variação da Provisão para Sinistros; ou
-
Custos com Sinistros / Parte dos Resseguradores nos Custos com Sinistros
Não-Vida /.../ Na Variação da Provisão para Sinistros.
ii)
Pela
anulação ou diminuição da provisão para sinistros a cargo dos
resseguradores
Lançamento
inverso ao da alínea anterior.
iii)
Pelo
débito aos resseguradores do custo do sinistro a seu cargo, regra geral, após o
pagamento do sinistro pela ressegurada
Ø A
débito
-
Resseguradores
Ø A
crédito
-
Provisões Técnicas de Resseguro Cedido Vida /.../ Provisão para Sinistros; ou
-
Provisões Técnicas de Resseguro Cedido Não-Vida /.../ Provisão para Sinistros.
iv)
Pela
transferência de “variações” para “montantes pagos”, após o pagamento do
sinistro pela ressegurada
Ø A
débito
-
Custos com Sinistros / Parte dos Resseguradores nos Custos com Sinistros Vida
/.../ Na Variação da Provisão para Sinistros; ou
-
Custos com Sinistros / Parte dos Resseguradores nos Custos com Sinistros
Não-Vida /.../ Na Variação da Provisão para Sinistros.
Ø A
crédito
-
Custos com Sinistros / Parte dos Resseguradores nos Custos com Sinistros Vida
/.../ Nos Montantes Pagos; ou
-
Custos com Sinistros / Parte dos Resseguradores nos Custos com Sinistros Não-Vida
/.../ Nos Montantes Pagos.
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