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Direito como produto cultural


Índice














Introdução


O "Homem vive em dois mundos", o mundo físico (exterior) e mundo espiritual (intrínseco a ele próprio). Estes dois mundos são aparentemente distintos, contudo, vivem num interação constante, isto é, o mundo espiritual (criado por cada um e em cada um) precisa necessariamente do mundo físico para passar do estado metafísico para o real. Dadas as circunstâncias, o Homem elabora as suas obras apoiado na realidade física, todavia, e por mais que queira ser objetivo, acaba sempre por transpor para elas aquilo que deambula no seu mundo espiritual. Em simples palavras, as obras do homem refletem sempre os seus valores. E sendo a cultura “o que o Homem acrescenta à natureza", ela não é mais do que a aplicação dos seus valores. Daqui infere-se, que o Direito enquanto obra do espírito humano é uma manifestação cultural.
A cultura apresenta-se como uma dinâmica viva. Quer dizer, as culturas estão em constante processo de evolução, introduzindo novos códigos e atualizando valores. Enquanto produto cultural, o Direito está exposto a mudanças que variam de acordo com o tempo e com o espaço, que por sua vez operam na sociedade. Assim sendo, as normas que vigoram dentro de um certo espaço e de um determinado período de tempo, refletem realidades sociais, económicas, culturais, políticas e ideológicas.
Daqui, concluímos que, nas diferentes culturas vigoram normas diferentes, que representam diferentes valores; que se confrontadas uns com os outros, acabam muitas vezes por se contradizer originando choques. Mas há valores que são universais, ou que pelo menos o deviam ser, como por exemplo, o valor vida, já que esta se afigura como um direito natural e universal de todos; quer seja homem, quer seja mulher, quer seja criança.






Direito como produto cultural


O Homem vive em 2 mundos – o da natureza (criado sem a intervenção ou inteligência do Homem, mas posto à sua disposição) e o do espírito (é construído pelo Homem e constituído por tudo o que ele faz como manifestação do seu espírito em que incorpora as suas aspirações, esperança e valores).
Estes 2 mundos completam-se, porquanto a vida cultural é condicionada pela Natureza e projeta-se sobre ela.
A cultura apresenta-se-nos como a realização de valores. O Direito enquanto obra do espírito humano é, com efeito, um fenómeno cultural e sensível a valores.
Como realidade cultural, o Direito varia consoante o espaço e o tempo, dado que vive da sociedade e para a sociedade, refletindo assim as tradições, mentalidades, crenças e ideologias dominantes.

Conceito de Direito
 Direito é constituído por um conjunto de normas de conduta social emanadas pelo Estado e garantidas pelo seu poder 
 O Direito é um fenómeno humano e social, pois decorre da vivência em sociedade do Homem que é necessário regular para garantir a paz social, a justiça, a segurança e o bem-estar económico
Diversos sentidos do termo Direito
Distingue-se: 
Direito Subjetivo –  exigir a outrem um determinado comportamento ou acção (poder ou faculdade, conferidos pela lei ao titular de um direito objetivo, de agir ou não de acordo com o conteúdo daquele)  
Direito Objetivo –  norma ou conjunto de normas jurídicas Para além disso, o Direito Subjectivo pressupõe, pois, a existência do correspondente Direito Objetivo.

Valores Fundamentais do Direito

Justiça

 

O principal fim a atingir pelo Direito é a Justiça – o seu valor fundamental. Por outro lado, trata-se de uma palavra ambígua e difícil de analisa, é um conceito correlativo ao Direito que se baseia na equidade. A definição clássica dada por Ulpiano, permite-nos ver a ligação entre justiça e direito, em que define justiça como a “vontade perpétua e constante de dar a cada um o seu direito”, para alguns autores esta noção não é aceitável pois não se refere à justiça em si mas à vontade justa, um elemento subjetivo. Para os gregos a justiça era a igualdade, tratar os iguais como iguais e os diferentes como diferentes. Aristóteles define justiça como um sinónimo de equidade e permite nos dividi-la em três modalidades que refletem diferentes relações conforme ela se refere ao que uma sociedade como um todo deve aos seus membros, ao que é devido pelos elementos da sociedade a eles mesmos e ao que os membros devêm a ela:
·       Justiça Distributiva
·       Justiça Comutativa (ou Corretiva)
·       Justiça Legal (ou Geral)
Estas modalidades correspondem a três tipos de relações, conforma a justiça Se refere ao que a sociedade como um todo deve aos seus membros; ao que é devido pelos membros da sociedade uns aos outros; e, por fim, ao que estes devem à sociedade.

Justiça Distributiva
Diz respeito à repartição de bens comuns que a sociedade deve fazer por todos os seus membros, segundo um critério de igualdade proporcional, que atende à finalidade da distribuição e à situação pessoal de quem a recebe
(segundo o mérito, as necessidades…)
.É a justiça, por excelência, dos governantes, visto que estes são administradores do bem comum.

Justiça Comutativa ou Corretiva
 Regula as relações dos membros da sociedade entre si, visando restabelecer ou corrigir os desequilíbrios que surgem nas relações interpessoais. Opera segundo um critério de igualdade simples, que se traduz na equivalência das prestações, e abrange tanto as trocas voluntárias ou lícitas como as involuntárias ou ilícitas
(Ex: se o Pedro vende um apartamento ao João, este deve pagar-lhe o valor equivalente ao apartamento)

Justiça Geral ou Legal
Relações entre a sociedade e os seus membros, no que concerne aos encargos que lhes são exigidos como contribuição para o bem comum e que devem ser repartidos
(Ex: impostos que são progressivos)
SUMA:
 Todos estes tipos de justiça podem levar a situações de injustiça, quando não se pondere devidamente a natureza e o valor intrínseco da pessoa humana ou não se tenha uma visão adequada das exigências individuais, dos fins da sociedade ou do bem comum. Atualmente, a maioria dos Estados reclama a justiça como um dos seus fins (sobretudo, nas vertentes comutativa e distributiva), embora a sua concretização não seja fácil nem pacífica, dada a variabilidade dos critérios usados e as diversas visões sobre a realização da justiça. Porém, cabe ao Estado, através de políticas apropriadas, corrigir as desigualdades ou desequilíbrios que surgem ou, pelo menos, evitar que se agravem os já existentes.
Por isto tudo, cabe dizer que a justiça representa um ideal pelo qual se deve nortear o ordenamento jurídico e que implica um constante e duro esforço para a sua realização concreta, perante as circunstâncias e a contínua evolução da vida social.

Segurança


Embora não tenha a projeção da Justiça, porquanto se encontra num valor de hierarquia inferior, não deixa de ser indispensável à vida social, pois está diretamente ligada à utilidade, às necessidades práticas e às urgências da vida.
– Segurança como sentido de paz social
O Direito visa garantir a convivência pacífica entre os homens, prevenindo e solucionando os conflitos que surgem inevitavelmente na vida social – missão pacificadora.
– Segurança com sentido de certeza jurídica
Exprime a aspiração a regras certas, ou seja, susceptíveis de serem conhecidas, pois corresponde a uma necessidade de previsibilidade e estabilidade na vida jurídica – é necessário que cada um possa prever quais as consequências jurídicas dos seus actos e saber aquilo com que pode contar. Existem inúmeras disposições nas quais se manifesta a preocupação de atender à certeza e estabilidade nas relações jurídicas:
leis genéricas, claras e abstractas que não dêem margem a ambiguidades; paraalém disso, devem ser publicadas oficialmente para garantir o conhecimento e compreensão de todos evitar as lacunas nas leis, que permitam uma interpretação mais ou menos subjectiva e arbitrária do intérprete certas formalidades que a lei exige para a validade ou prova de determinados actos jurídicos.
SUMA:  Assim, as leis devem ser claras, genéricas, abstractas, não devem suscitar dúvidase devem ser do conhecimento geral visa atingir o rigor e a objectividade.

Princípio da não retroatividade da lei
Procura evitar-se que as leis venham a produzir efeitos imprevisíveis e a alterar situações ou direitos adquiridos, porque a regra é a de que a lei só dispõe para o futuro Esta regra tem como objectivo que a pessoa não seja punida por um acto que na altura em que o cometeu não era considerado “crime”, ou que venha a sofrer uma sanção mais grave do que a prevista no momento do “crime”. Contudo, existe retroactividade da lei quando a nova lei é favorável ao arguido.
Princípio do caso julgado
Não há possibilidade de recurso ordinário contra decisões transitadas em julgado, ou seja, o caso objecto de decisão judicial não pode ser reposto perante os tribunais.
– Segurança no seu sentido mais amplo
O Direito deve “proteger os direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos e os defender das eventuais arbitrariedades dos poderes públicos ou abusos de poder”.Com efeito, surge uma limitação do poder político em benefício dos direitos e liberdades reconhecidos aos cidadãos.
.Hoje em dia ampliou-se ainda mais este último sentido da segurança, devido à importância dos direitos económicos, sociais e culturais dos cidadãos correspondentes à nova escala de objetivos e funções do Estado, que o leva inclusive a assegurar aos cidadãos condições materiais de vida dignas
(Ex: as leis que estabelecem níveis salariais mínimos, pensões sociais, gratuidade na escolaridade obrigatória ou nos serviços de saúde, etc.)

Relação entre o Direito a Justiça e a Segurança


Como vimos, os dois fins primordiais do Direito são a Justiça e a Segurança. Contudo, a compatibilização da segurança com a justiça não é fácil, pelo que há que prever situações de tensão ou conflito entre estes dois valores e tentar resolvê-las damaneira mais adequada  na prática, a realização da justiça e segurança simultaneamente apresenta grandes dificuldades, pelo que o Direito umas vezes dê prevalência à justiça sobre a segurança e outras vezes o inverso. Em qualquer dos casos, o sacrifício tem de ser parcial, o que significa que não se pode afastar totalmente de qualquer desses valores, pois a finalidade é conjugar ambos.
A realização da justiça e da segurança apresenta grandes dificuldades, pois nem sempre é possível compatibilizar ambos, o que leva a que o Direito umas vezes dê prevalência à justiça sobre a segurança e outras vezes o inverso. Em qualquer destes casos, o sacrifício tem de ser parcial, o que significa que não se pode afastar totalmente um desses valores.
Enfim, terá sempre de existir prudência a regular o doseamento destes dois valores, procurando-se uma certa racionalidade na criação do Direito, a fim de que este cumpra a sua missão de realizar a ordem segundo a justiça.

Equidade


Como já estudámos, as normas jurídicas são genéricas e abstratas, sendo – lhes impossível prever todos os casos singulares, extremamente variáveis. Desta forma, podem acontecer soluções que não se mostrem as mais adequadas e justas na sua aplicação a determinados casos concretos, consideradas as circunstâncias particulares que os acompanham.
Seria então mediante a equidade que se resolveriam estes casos, facultando-se ao juiz o afastar-se da norma, para que, atendendo às particularidades de cada caso, encontrasse a solução mais justa, ou seja, a equidade adapta-se melhor ao caso concreto do que a solução estabelecida na lei, da qual se afasta.
 Deste modo, a equidade sai da legalidade e toma uma decisão sua, por causa do caso concreto (situação específica) em relação à lei genérica, mas sempre tendo em conta o valor justiça (garantir que o Direito é justo).
 Porém, o recurso à equidade, porque dá lugar a um largo campo de atuação pessoal do julgador, poderia implicar sérios riscos de incerteza e insegurança; daí que os legisladores limitem a sua aplicação, pois o Direito, para além da justiça, tem como fima segurança jurídica.
Equidade consiste na adaptação da regra existente à situação concreta, observando-se os critérios de justiça e igualdade. Pode-se dizer, então, que a equidade adapta a regra a um caso específico, a fim de deixá-la mais justa. Ela é uma forma de se aplicar o Direito, mas sendo o mais próximo possível do justo para as duas partes.
Essa adaptação, contudo, não pode ser de livre-arbítrio e nem pode ser contrária ao conteúdo expresso da norma. Ela deve levar em conta a moral social vigente, o regime político Estatal e os princípios gerais do Direito. Além disso, a mesma "não corrige o que é justo na lei, mas completa o que a justiça não alcança" [].
Sem a presença da equidade no ordenamento jurídico, a aplicação das leis criadas pelos legisladores e outorgadas pelo chefe do Executivo acabariam por se tornar muito rígidas, o que beneficiaria grande parte da população; mas ao mesmo tempo, prejudicaria alguns casos específicos aos quais a lei não teria como alcançar. Esta afirmação pode ser verificada na seguinte fala contida na obra "Estudios sobre el processo civil" de Piero Calamandrei”.
O legislador permite ao juiz aplicar a norma com equidade, ou seja, temperar seu rigor naqueles casos em que a aplicação da mesma (no caso, "a mesma" seria "a lei") levaria ao sacrifício de interesses individuais que o legislador não pôde explicitamente proteger em sua norma.[]
Já o conceito de jurisprudência é "fonte secundária do Direito que consiste em aplicar, a casos semelhantes, orientação uniforme dos tribunais".
A partir dos dados oferecidos acima e do que já foi falado sobre equidade, chegamos à conclusão de que a diferença existente entre os três é de que a isonomia consiste na garantia de direitos iguais a todos perante a lei, enquanto que a jurisprudência é uma decisão generalizada dos tribunais a respeito de questões semelhantes e a equidade é a adaptação da lei a fim de fazer justiça da forma mais humana e justa possível.
Apesar disso, isonomia, jurisprudência e equidade têm uma coisa em comum: os três tentam nos proporcionar o maior grau de justiça que o Direito pode nos oferecer, porém, de formas diferentes.
Só se pode recorrer à equidade se:
·       Houver disposição legal que o permita
·       Houver acordo das partes e a relação jurídica não seja indisponível
·       As partes tiverem previamente convencionado o recurso à equidade, nos termos aplicáveis à cláusula compromissória

Na interpretação da lei

Interpretar significa, acima de tudo, entender. Para que possamos entender um texto, precisamos utilizar toda nossa capacidade interpretativa; ou seja, devemos ser críticos e avaliarmos atenciosa e minuciosamente toda e quaisquer possibilidades e situações que podem estar envolvidas.
Porém, a equidade não é meramente um simples método de interpretação, e sim uma forma de se evitar que a aplicação da norma geral do Direito positivo em casos concretos e específicos, acabe prejudicando alguns indivíduos; haja vista que toda interpretação da justiça deva tender para o justo, à medida do possível.
De acordo com o doutrinador Alípio Silveira, a equidade na interpretação da lei significa o "predomínio do espírito ou intenção do legislador sobre a letra da lei e também significa a preferência, entre várias interpretações possíveis de um mesmo texto legal, da mais benigna e humana" .

Na integração da lei

O ordenamento jurídico (apesar de todo o seu decretismo) caracteriza-se por ser aberto e incompleto e, desta forma, acaba, deixando vazios ou lacunas que precisam de ser preenchidas de alguma forma. Com o avanço da sociedade, a mesma passa, ao longo do caminho, a precisar de novas regras, exigindo mais do Direito. Essa evolução social gera o aparecimento de lacunas nas leis, pois muitas vezes, o legislador, seja por falta de competência ou simplesmente pelo decretismo causado por esse avanço social e/ou negligência das mesmas, vai criar um abismo entre as leis e a sociedade.
Essas lacunas podem ser voluntárias ou involuntárias. As primeiras caracterizam-se por terem sido deixadas propositadamente pelo legislador e as segundas, devem ser preenchidas através da analogia, do costume, dos princípios gerais do Direito e, na insuficiência destes, através da equidade.

Na correção da lei

São raros os casos em que o juiz considera a lei inadaptável ao caso concreto, mas isso não quer dizer que este fato seja impossível. Quando isto ocorre, o juiz pode contar com o poder da equidade para estabelecer uma norma individual ao caso específico.
Como podemos ver, as funções da equidade mostram a sua enorme influência, tanto na aplicação, pois serve como uma base para o aplicador do Direito, além de ditar regras para a aplicação das leis; como na interpretação, pois ajuda o aplicador da lei a tratar casos singulares de uma forma mais humana e justa; na integração, pois suplementa a lei, preenchendo os vazios encontrados na mesma; e na correção das leis, pois previnem que as leis obsoletas acabem prejudicando algumas pessoas que tenham casos mais específicos. caráter religioso-cristão, preconizava que a equidade era a justiça suavizada pela misericórdia.

No direito moderno

O direito moderno, influenciado pela corrente do Direito Positivo, tentou minimizar a importância da equidade. Ou seja, o Direito Positivo prega que a generalidade e abstração das normas jurídicas irá garantir a abrangência de todos os fatos; porém, é notório que não se consegue tal efeito porque a generalidade e abstratividade da norma jurídica não absorve todos os novos fatos ainda não legislados. Portanto, a equidade é usada como um mecanismo para suprir lacunas da lei, pois as novas relações e novos fatos jurídicos possíveis são infinitos.
A fim de tornar a realização da justiça mais ampla e equitativa, foi autorizada, a aplicação da equidade pelos juízes, ou seja, eles podem quando autorizados pela lei, criar e aplicar uma lei específica para um caso concreto específico. Todavia, de acordo com a divisão dos três poderes foi impedida a correção da lei pelo juiz, cabendo ao legislativo realizar tal atividade.
É a flexibilização da norma aplicável para não resultar em injustiça, ou criação e aplicação pelo juiz de nova norma específica para caso concreto específico.

Direito Cultura e Ideologia


O Direito enquanto obra do espírito humano é um fenómeno cultural e, como tal, fortemente influenciado pelas realidades sociais, económicas, culturais, políticas e, por conseguinte, ideológicas.Todas estas realidades evoluem incessantemente, em grande parte devido à propagação das ideologias pelos meios de comunicação social.
Ideologia designa um conjunto mais ou menos alargado de crenças que influenciam os grupos ou que legitimam as respectivas formas de acção na sociedade, tendo em vista um projeto coletivo de organização social.
As ideologias são factores de propulsão para a evolução social e, por consequência, para o  Direito,  mas o Direito é também muito importante para a imposição de uma ideologia – sem o qual ela nunca se imporia.
 Muitas vezes o Estado para atingir os seus objetivos, nomeadamente os de carácter económico e social, recorre a um conjunto complexo de normas – engenharia jurídica; assim, o Direito surge como um instrumento de realização das ações do Estado, e é através dessas políticas que o Estado tenta acabar com os conflitos de interesse. O critério ideológico tem sido o mais utilizado para distinguir as várias Ordens Jurídicas, de acordo com as ideias e o espírito das instituições ao serviço das quais estão.
Atualmente a criação do Direito está muito relacionada e muito pressionada pela realidade vivencial (experiencial/existencial) que a sociedade presencia, as questões processuais se estruturam em modelos e atitudes utilitaristas, caracteristicamente representadas por um individualismo ideológico-representativo.

Segundo Ovídio Baptista da SILVA a ideologia, de um ponto de partida individualista deve ser observada sob dois aspectos; o primeiro refere-se à atribuição aos nossos opositores à condição de ideológicos, na suposição que predispomos de um “Ponto de Arquimedes”, como se houvesse o acesso privilegiado à verdade absoluta e o segundo como que uma consequência do primeiro, de que o “outro” não aceitasse nossa idéia por não conseguir atingir a nossa verdade, o que a determinaria como implicitamente válida, permanecendo como única

Esta postura, “é a marca do pensamento conservador. Tudo o que questiona a “realidade”, construída pelo pensamento conservador, é ideológico, no sentido do irreal, pois a visão conservadora supõe que nosso “mundo” seja o único possível.

Esse aspeto negativo, no entanto, é um dos pontos de partida para o entendimento do Direito como fenômeno ideológico, tendo em vista o que se propôs como a necessidade da ideologia, deve-se entender que as ideologias “não são superficiais, irrelevantes ou nefastas...não se pode apenas visualizar seu aspeto negativo de distorção e com isso descartar sua função e minimizar sua operacionalidade, ainda que sob novas roupagens e rotulações nos horizontes do atual estágio das sociedades pós-industriais e globalizadas” 

O direito está tomado pelo pensamento conservador e nele nitidamente a ideologia em seu sentido representativo tem grande força e se alastra por questões teóricas e científicas até questões práticas do cotidiano. 

A formação epistemológica jurídica é construída em formação e relação com a ideologia. Raymond BOUDON se refere aos efeitos epistemológicos no conhecimento científico, de maneira que “não somente o conhecimento científico está ao abrigo das crenças não demonstradas, como não poderia existir sem elas” ou seja, seu objetivo é demonstrar que a ideologia se desenvolve mesmo no coração do trabalho científico

 

A questão que vem à tona diante de realidade da ideologia no estudo científico é que desde as discussões dos modelos levantadas por POPPER, KUHN e FEYERABEND, atrás disso, há, sobretudo, um efeito epistemológico, ambientado pela ideologia21

Um segundo ponto analisado por MARX, estritamente mais jurídico, é que se transpôs uma medida sancionadora de direito público para o campo do direito privado, vez que a pena de trabalhos forçados se aplica sobre a pessoa do imputado e não de seu patrimônio, a própria multa que colocou como alternativa vai para o particular, supostamente ofendido em seu direito de propriedade e não aos cofres públicos.

Jürgen HABERMAS, que principalmente na primeira fase de seu pensamento mantinha apego à tradição marxista, apresenta sua conceituação  no sentido de “para quem a verdade é algo inseparável da sociedade que a concebe e essencialmente animada por um interesse, nem sempre confessado, parte-se de uma concepção prévia, de certa forma considerada justa, de organização social, o que possibilita em caso de discrepância, a denúncia ideológica ou Ideologiekritik”28

Em importante obra publicada originariamente em 1968, Técnica e ciência como “ideologia” (Technick und Wissenschaft als “ideologie”), HABERMAS alcança uma boa crítica ao positivismo quando assevera que o tecnicismo consiste em uma ideologia que tenta por em prática, sob qualquer preço, o conhecimento técnico e a ilusão objetiva das ciências  29

Enfim, o Direito se manifesta como fenômeno ideológico e a crítica da ideologia no Direito se configura diante dos pressupostos críticos propostos pela Filosofia do Direito, que devem projetar o estudo do direito, a mentalidade jurídica e o senso comum para uma justificação e efetividade de um Estado Democrático de Direito.  

 

 

Considerações finais


A Declaração Universal dos Direitos humanos de 1948 reconhece juridicamente a existência da dignidade pertencente ao ser Humano. Segundo esta - "nascer vivo" - é o único pré-requisito necessário para se ser respeitado. Se assim o é, porque é que se mata "o que rouba uma galinha, ou aquele a quem nasçam primeiro os dentes superiores, ou quem nasça numa quarta-feira?" Porque é que indiscriminadamente se retira ao Homem a “única coisa que ele tem como sua"? E ainda por cima, por simples insignificâncias! Será que são mesmo insignificâncias? Qual a legitimidade dos casos em cima citados? Porque é que na nossa comunidade a morte é condenada juridicamente, enquanto noutras sociedades é aplaudida? Quem está certo? Quem está errado? Estes atos, práticas ou valores, exprimem algo que pertence a um determinado povo, e aparece como a expressão da cultura dele. Será que, a partir do momento em que são considerados como tal, ganham o rótulo de incontestáveis? O relativismo cultural defende que o bem e o mal são relativos a cada cultura. O "bem" coincide com o que é "socialmente aprovado," e o mal com o que é respetivamente reprovado de acordo com os valores vigentes em cada cultura. Sendo que, embora os conceitos de bem e mal derivem de cultura para cultura, todos têm que os aceitar enquanto relativo a uma dada cultura, já que, o que para uns é o bem, segundo os seus padrões culturais, para outros pode significar o mal e vice-versa. Consideremos o seguinte exemplo: Em algumas culturas, é "dever do filho matar os pais antes de serem velhos". Considera-se que este ato é um culto particular de uma cultura. E, sendo assim, segundo o relativismo cultural, não se pode ter nada contra? Só porque faz parte da tradição de um povo retirar a vida a alguém não é condenável? O relativismo cultural revela 2 faces. Pode, sem dúvida, significar protecção às minorias e à preservação dos respectivos valores. Mas pode também significar, condescendência com costumes que atentam contra a dignidade do ser humano: mutilações rituais ou castigos degradantes e especialmente graves como no caso de agressão às mulheres verificados recentemente na Argélia e Afeganistão em que "o marido tem direito de vida ou de morte sobre a sua mulher". Depois deste esclarecimento, afinal quem têm razão? A defesa relativismo cultural é viável? Pode o direito actuar sobre estes casos? Não nos podemos esquecer que o direito que vigora nessas comunidades é modelado pela cultura, então não é isento. Responder a estas questões é complicado até porque o próprio "relativismo é relativo”, se é que me faço entender. Do meu ponto de vista pessoal, quando se trata de valores como a vida, devem-se ultrapassar todas e quaisquer barreiras culturais. Pois a vida, por exemplo, é o único bem pessoal, que depois de atacado não mais pode ser remendado. E é isto que lhe dá importância: o facto de ser finito e de ser o único bem que o Homem tem como verdadeiramente seu. Falo na vida mas podia falar integridade Humana: física e moral; na dignidade em que todo o ser deve e pode viver enquanto "fruto da mesma árvore". Claro que esta perspetiva revela a tal divergência de pensamentos, o tal choque de culturas que tanto se fala por ai. E assim cai-se no ciclo vicioso da discussão do certo e do errado.




















Referencias bibliografia


Telles, G. (1999) Introdução ao Estudo do Direito, 2º Volume, 11ª Edição refundida e atualizada, Lisboa
Introdução ao Estudo de Direito Resumo, http:/www.google.com/direito como produto cultural

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